segunda-feira, 14 de março de 2011


DIA NACIONAL DA POESIA

O Dia Nacional da Poesia, não por acaso, coincide com a comemoração do nascimento do grande poeta Castro Alves. Sua arte era movida pelo amor e pela luta por liberdade e justiça.

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TE EMBALAREI COM UMA CANÇÃO SENTIDA


Senta-te aqui ao meu lado, amiga, e eu te contarei uma história. Faz tempo que não te conto uma história na beira deste cais. A noite está cheia de estrelas, são homens valentes que morreram. Senta-te aqui, dá-me a tua mão, vou te contar a história de um homem valente. Vês aquela estrela lá longe, mais além do navio fundeado, mais além do forte velho, da sombra das ilhas? Deve ser ele iluminando o céu da Bahia. Não sei se será bem uma história o que te vou contar. Talvez seja uma louvação, talvez seja um abc. Este de quem te falarei não tinha armas. Ia de peito aberto e a todos vencia. Vencia os homens, os fortes do mundo que esmagavam negros escravos, vencia as mulheres, as mais belas da terra, as que esmagavam corações. Te direi das suas lutas, das primeiras e das últimas, e saberás então o motivo por que ninguém é indiferente perante ele, odiado dos tiranos, amado do povo.

Talvez invente menos, talvez não invente mesmo nada que nada é preciso acrescentar para que a sua vida seja um prodígio de beleza. É possível, no entanto, que te diga que ele fez coisas que apenas escreveu, que te conte de conversas que ninguém assistiu e talvez nem houvessem existido. Mas que, em verdade, deviam ter existido, estavam no que ele produziu, nos versos que deixou. Se o fizer, amiga, será para que tenhas uma mais nítida ideia de como ele era forte como o tufão quando se jogava contra as injustiças e de como era brando como a brisa quando a sua voz se dirigia a tímidos ouvidos de mulher. Só inventarei o que estiver de acordo com ele, o que couber na sua figura cuja sombra se projeta cada vez maior sobre todos os que escrevem e sentem no Brasil. Até sobre este teu amigo, contador de histórias de negros e marítimos.

Tinha a força do vento noroeste, o seu ímpeto, a sua violência. Tinha a sua beleza também. E deixou o ar mais puro, a sua lembrança imortal. Tinha a precocidade desses moleques de rua a quem acaricias a cabeça e dos quais te contei a história. Começou muito moço e muito moço terminou. Foi o mais belo espetáculo de juventude e de gênio que os céus da América presenciaram. No tempo que andou nestas e noutras ruas, disse tantas e tão belas coisas, amiga, que sua voz ficou soando para sempre e é cada vez mais alta e cada vez mais a voz de centenas, de milhares, de milhões de pessoas. É a tua voz, negra, é a voz do cais inteiro e da cidade lá atrás também. Falou por todos nós como nenhum de nós falaria. É ainda hoje o maior e o mais moço de nós todos.

Este, cuja história vou te contar, foi amado e amou muitas mulheres. Vieram brancas, judias e mestiças, tímidas e afoitas, para os seus braços e para o seu leito. Para uma, no entanto, guardou ele suas melhores palavras, as mais doces, as mais ternas, as mais belas. Essa noiva tem um nome lindo, negra: liberdade. Vê no céu, ele brilha, é a mais poderosa das estrelas. Mas o encontrarás também nas ruas de qualquer cidade, no quarto de qualquer casa. Seja onde for que haja jovens corações pulsando pela humanidade, em qualquer desses corações encontrarás Castro Alves.
Nasceu sob o signo do amor mais livre, dos instintos lutando contra os preconceitos, do homem procurando a sua felicidade contra tudo e contra todos.

 

Texto extraído do livro ABC de Castro Alves, de Jorge Amado
Saiba mais de Castro Alves >> AQUI

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